Nome: SpAIder's Game
Editora: NA
Autor: Javier Fopiani, Cronomantic, nlk-o, Ximo
Ano de lançamento: 2024
Género: Aventura, Puzzle
Teclas: Não redefiníveis
Joystick: Kempston, Sinclair
Memória: 128K
Número de jogadores: 1
Descarga: aqui
Muito pontualmente aparece um programa assim: mais do que um jogo, é uma verdadeira experiência filosófica interactiva e sensorial, deixando-nos uma forte sensação de inquietude e até de medo. Inquietude porque apesar das vantagens e benefícios da Inteligência Artificial, um sofisma incontornável, nem tudo é transparente no que toca a esta temática. Existiu, desde sempre, o receio que se estivesse a criar um monstro que, mais tarde ou mais cedo, iria assumir o controlo da situação e dominar a humanidade. E neste jogo, se assim lhe podemos chamar, esse monstro torna-se realidade, assumindo a forma de uma aranha.
SpAIder's Game tem também, por outro lado, múltiplas referência à Sétima Arte. Quando estávamos a experimentar o jogo, saltou-nos logo à memória duas obras de culto do cinema de terror. Em primeiro lugar, SAW. Os "mind games" são frequentes por parte deste ser com a forma de aracnídeo e que se assume como Mestre, fazendo-nos lembrar as maquiavélicas maquinações de Jigsaw. Sentimo-nos manipulados a todo o instante, e isso acontece porque de factos o estamos a ser. Quem chegar ao fim irá certamente perceber isso.
Mas o jogo também tem imensas alusões a Cube, uma obra talvez menos conhecida que SAW, mas nem por isso menos importante (e na nossa opinião até superior). Isso porque sentimo-nos a fazer parte de um jogo, cujo destino já se encontra traçado, independentemente do caminho que tomemos.
SpAIder's Game é então composto por um conjunto de seis mini-programas (ou testes, como lhe quisermos chamar), sendo que os dois primeiros utilizam a mesma base comum, e o último, na realidade, não é sequer um jogo no sentido literal do termo. Eis a sua ordem:
- Russian Roulette Strategy
- Russian Roulette Outcome
- Entrance to the Labyrinth
- Labyrinth Doors
- Labyrinth Spiders
- Endgame
Comum a todos, as reflexões que o Mestre vai fazendo ao longo de cada uma das nossas acções, revelando sempre um tom cáustico, repleto de sarcasmo, levando-nos sempre a duvidar das suas boas intenções. Desenganem-se, o Mestre é tudo menos um ser benevolente. Lembrem-se disso quando estiverem a pensar na resposta correcta a dar às questões que vão sendo colocadas (em todos os testes, apenas temos que ir escolhendo a opção que nos parece mais indicada a cada situação).
Ainda antes de iniciarmos a Roleta Russa, surge-nos uma questão inicial na qual somos confrontados com determinada situação. A resposta que damos vai definir o nosso carácter, que pode ser de um ser medroso, conversador, pensador ou o denominado "chico-esperto". A narrativa do próprio Mestre vai variar conforme o nosso carácter, sendo que num dos casos até temos possibilidade de entrar em conversação com ele. Se pensarem em Mel Croucher e em iD, não andarão muito longe daquilo que se pretende em SpAIder's Game. Também aqui, o humor do ser aracnídeo omnipresente vai variando conforme as nossas reacções e atitudes durante o jogo.
Segue-se então o primeiro teste a sério, Roleta Russa, e este apela à nossa parte mais racional e lógica. Devemos ter sempre presente o número de balas de um revólver, assim como a Lei das Probabilidades, tal e qual como no famoso e macabro jogo. O objectivo é matar e não ser morto, mesmo que isso implique, quando acharmos conveniente, apontarmos a arma a nós próprios (e esperar que não esteja a bala na câmara). As regras são relativamente simples e explicadas inicialmente pelo Mestre. Resulta daí um exercício que tem tanto de perturbador, como de absorvente. E as primeiras questões filosóficas e de moral são precisamente colocadas nesta parte. De todas, esta foi a parte que mais gostámos.
Sobrevivendo, avançamos então para a entrada no labirinto, uma homenagem às aventuras de texto originais e que surgiram há mais de 40 anos. Os aventureiros mais experimentados conseguirão desde logo apanhar a sequência de cinco letras correctas (as portas vão sendo abertas sucessivamente por cada uma das letras). De qualquer forma, para os menos vivenciados no género, vão sendo-nos dadas algumas dicas que permitem chegar ao fim são e salvos. Corrigimos, ao fim não, apenas às portas que dão acesso ao labirinto. Aqui há que escolher a porta certa e o único conselho que podemos dar é que sejam fiéis às vossas convicções. Talvez assim consigam chegar ao labirinto.
No labirinto, o Mestre mostra que apesar de tudo ainda tem um bom fundo, mesmo que seja mesmo lá no fundo. Assim, municia-nos com uma arma e algumas balas. Há que saber o momento certo para eliminar as aranhas que caminham rapidamente na nossa direcção ou, em alternativa, recolher as balas. Um passo em falso, e somos devorados vivos.
Por fim, o apotéotico final. Este, mais que um teste, é uma reflexão do próprio Mestre onde ficamos a conhecer as suas verdadeiras intenções. E tal como um verdadeiro filme dos Monty Python, há sempre mais qualquer coisa após o final...
SpAIder's Game é então dos programas mais originais que vimos em muito tempo. Não tanto pelo jogo, que apenas por si só é bastante interessante, mas por todas as questões morais que vai levantando e que nos vai fazendo pensar, à medida que vamos avançando nos testes. Vale a pena chegar ao fim com cada um dos nossos "eu", nem que seja para ver as diferentes reflexões que nos são apresentadas.
Com tudo isso, não nos é possível dar sequer uma nota este jogo. Na realidade, não saberíamos como o fazer e alguns dos parâmetros nem sequer são quantificáveis. O que podemos dizer é que no seu conjunto é brilhante e merece inteiramente que venham aqui descarregá-lo e dar uma pequena contribuição aos seus autores (o jogo tem um custo irrisório de 2 euros). Poderão também aqui ver o directo que o nosso amigo Javi Ortiz está a fazer sobre este lançamento.
Muito obrigado por esta incrível resenha, André! É uma honra receber uma análise tão detalhada e reflexiva de SpAIder's Game. Adoro como você captou o espírito do jogo e o papel do Mestre, esse guia sarcástico e ambivalente que sempre tenta nos manter em alerta. Sua menção às aventuras de texto clássicas e a Mel Croucher me agradou muito.
ResponderEliminarObrigado por dedicar seu tempo para escrever esta resenha e por incentivar os jogadores a baixar o jogo.
Um forte abraço e parabéns pela sua dedicação ao homebrew. Nos vemos no próximo jogo!
Nós, Planeta Sinclair e comunidade, é que agradecemos por este belíssimo jogo. Um grande abraço e estamos ansiosos por ver o vosso próximo trabalho com uma equipa que muito prezamos.
EliminarReparo que este jogo não aparece no Spectrum Computing, apesar dos outros jogos do Javier Fopiani aparecerem. Alguém sabe porquê?!
ResponderEliminarEstá lá, só que nos censurados. Não se encontram na busca normal.
EliminarNem sabia isso dos Censurados... sei do Grupo rock Português, mas não tinha ideia que existia tal "música" no Spectrum Computing... Podes explicar como pesquiso em toda a BD, incluíndo na referida lista? Experimentei agora mesmo na Pesquisa Avançada mas não encontrei forma de chegar aos Censurados... Grazie milé!
ResponderEliminarNão sei bem como é, mas o jogo está aqui: https://spectrumcomputing.co.uk/entry/43980/ZX-Spectrum/SpAIders_Game
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